Ocupação espacial e vivências…
Estamos perfeitamente conscientes de que o fenómeno de sociabilidade destes povos foi sempre ditado por necessidades de sobrevivência… A especificidade de um certo modo de ocupação do espaço, a originalidade de um tipo de habitat cuja longa sobrevivência não pode explicar-se senão pelo caráter estacionário da organização social e da vida económica, transportam-nos para uma abordagem onde se procura fazer a evolução das formas de ocupação e de convivência espacial.
Se estas questões constituem um fator determinado pelo tempo ou pela necessidade de adequação a uma nova realidade, estamos sobretudo a pensar nesta última, porquanto a investida dos romanos durante as campanhas de Décimo Júnio Bruto exigiu que houvesse uma necessidade de levar à consecução uma adequada e mais eficiente “plataforma” dos aspetos defensivos, através do uso generalizado da pedra na construção das casas - até aqui eram fabricadas usando só os materiais vegetais – como também na adoção do torno de oleiro pois a única e principal modo de vida até então era a atividade pastoril, principalmente cabras, ovelhas, bois e porcos e, em especial, os cavalos. Praticavam a caça e a pesca. Há fontes que afirmam que os Lusitanos utilizavam o arado, cultivavam o trigo, o linho, de que teciam couraças, referido por Estrabão na sua Geografia, a vinha e a oliveira, sendo famosas, pela sua doçura, as suas azeitonas secas e alguns frutos, como as cerejas.
A atividade militar neste território levou indubitavelmente à alteração do “modus vivendi” e “modus faciendi” desta população pelo que a edificação de castros no cimo das elevações ou no meio de dois cursos de água obrigou estas tribos a ter um “modus operandi” diferente e mais adequado ao contexto de investidas permanentes, muito da feição de Viriato. Determinado por este desiderato as plantas, as dimensões e a articulação das casas demonstram um caráter lato da unidade familiar, constituída pelo agregado de famílias simples ou nucleares descendentes do mesmo tronco e residentes no mesmo espaço, por vezes murado e com pátio que servia a todos para o desempenho de pequenas atividades agro-pastoris. Não se conhece na área dos castros nenhuma praça pública, centro cívico ou templo revelando por isso uma simplicidade de organização social.
Ainda quanto à construção das casas e muralhas usavam, para cortar a pedra, os picos e cunhas. No fabrico de armamento ofensivo incluem-se as espadas e punhais geralmente afalcatados1, as pontas de lança e ponteiras ou chuços. Como armas defensivas temos os capacetes, os escudos redondos e pequenos (caetra).
Muito pouco se sabe sobre a prática de cultos religiosos. Porém, podemos adiantar que eles se resumiam à divinização de elementos celestes e das águas, fontes, rios, montes, rochedos e outros seres e forças da natureza. Os teónimos mais vulgares são de culto local, como: Banda, Cosus, Nabia e Reva. O culto dos mortos restringia-se à realização de ritos de incineração depositando posteriormente as cinzas no interior das habitações em pequenas fossas de planta circular com paramentos de alvenaria ou em recintos próprios no exterior da casa, mas dentro do núcleo familiar. O funeral de Viriato datado de 139 a. C., descrito por Diodoro Sículo e Apiano são a confirmação dessa prática corrente: "O cadáver, magnificamente vestido, foi queimado numa pira, onde sacrificaram numerosas vítimas, enquanto os soldados corriam em volta, formados, empunhando armas e cantando, à maneira bárbara, as suas glórias em honra do herói. Por fim, duzentos pares de guerreiros efetuaram simulacros de combates e não abandonaram o local enquanto o fogo se não extinguiu por completo”.
1 Recolhidos em bolsas de vegetais (numa fase inicia) ou em peles de animais (fase posterior).
Augusto Moura Brito
17-02-2017